31 março 2012

Antonio Calloni - A Mulher dos Trilhos


tu não és meu amor
porque vens falar comigo
com voz desonesta de homem de fácil repertório
tu não és meu amor
porque tens o medo masculino da noite
e queres me salvar
tu não és meu amor
porque como homem não compreendes
meus sorrisos subterrâneo
tu não és meu amor
porque terias pavor do monstro de ferro
a passar sobre ti no meio da noite
eu durmo e o trem passa por mim
porque o espaço é suficiente
e minha noite é feita de feitiços
se acreditares em mim posso te amar
se me amares posso delicadamente te matar
se morrermos, podemos viver, amor meu
talvez em casa grande ou pequena
em paragens verdes ou de cores outras
mas é necessária a primeira coragem
e o risco é tão simples: basta deitar
basta um pouco de repouso pra seres meu amor
se fosses um pouco mulher, não rias, só um pouco
sem perder músculos e pelos
sem perder teu rijo fascínio
sem perder, só ganhar
sem ganhar, só perder
vem, amor meu
e me cobre viril, feito reprodutor de raça
pra depois descansar tua natureza tão igual a de um touro,
ou de uma menina ainda não desenhada
vem, amor meu
e dorme comigo feito irmão como um santo
pra podermos sonhar profundamente
e deixar que o trem passe feroz sobre nós
enquanto dormimos abraçados
abraçados feito dois anjos
para depois do trem acordamos como faunos, como felinos
como homem e mulher
vem, amor meu
o risco é o repouso e se quiseres eu posso te amar

Antonio Calloni


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